Aquilo que vou guardar são as mãos entrelaçadas que levas sorrateiramente à boca, o amor perdido que fragilmente te abraça o dedo, o bigode por aparar, o inclinar de pescoço como quem ouve mal, a cerimónia do nó de gravata torto, o teu olhar. O teu olhar que como as cores de Outono são de rara beleza. Obrigada Poeta.
PART II:
115. É uma flor. Não uma flor de jardim que alegra quem a cultiva, ou mesmo de um caminho perdido onde a veja alguém que passa. É uma flor de um campo bravio e onde pôs gosto em morar. O mais provável era ninguém a ver como muitas outras que ninguém vê. Terá convívio com algum insecto? Leva-lhe a aragem o pólen para outra flor que o espera? Mas é possível, simplesmente possível, que nasça e morra sem mais. Olhei-a eu por acaso - porque é que nasceste? Mas não lho perguntei porque toda a pergunta era absurda. Uma flor . Nascida e morta sem razão, nem sequer a razão de alguém a olhar. Flor gratuita e todo o seu mistério sem mistério nela. E toda a filosofia da vida aí.
Vergílio Ferreira, in Escrever, Bertrand Editora
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